Aulas, reuniões e encontros remotos e os incidentes digitais em época de pandemia

Leandro Garcia
26/09/2020

Breves reflexões sobre o uso dos canais de comunicação em momento de isolamento social.

Prezado leitor esse breve texto vem rapidamente focar as novas situações a que fomos submetidos em razão da Pandemia, especialmente pelo impositivo isolamento social ocorrido por fins sanitários, de modo que todos tivemos que nos comunicar a partir daí se utilizando cada vez mais de aplicativos como o Meet, o Zoom, o Microsoft Teams, o WhatsApp, o Instagram, o Facebook e o YouTube, em suma, com muitos participando de diversas aulas remotas ou reuniões online, cursos e correlatos. De tal forma surge o questionamento pontual: nós estávamos preparados para essa superexposição e essa hiperconexão obrigatória por quase o dia todo? Crianças, adolescentes, adultos e idosos têm a maturidade digital suficiente para tanto?

Nesse cenário advieram diversos incidentes digitais, seja por exposição do direito de imagem de uma forma inadequada, seja por abusos no uso do direito da manifestação do pensamento, ou seja, conforme situações por vezes voluntárias e muitas involuntárias, tendo em conta que todos foram submetidos a um chamado “Big Brother” ostensivo, por força da gravidade da COVID-19, sem tempo para adaptações para o uso excessivo, em especial considerando aqueles que até então tinham um uso bem menos acentuado.

É frequente o uso dessas tecnologias da comunicação e da informação com câmeras ligadas ao nosso redor e áudios abertos, afinal quem nunca se esqueceu de que estava sendo filmada/o em algum momento desses? Daí que muitas das vezes saltam as gafes ou coisas piores, como exemplificaremos mais abaixo, o que é natural, afinal as casas são ambientes “complexos”.

A Constituição Federal brasileira nos garante a proteção da imagem, da honra, ao direito de manifestação do pensamento, a intimidade, a privacidade, a reputação e outros direitos conexos, porém esses direitos eventualmente podem ser solapados por abuso de direito de outrem, ou seja, alguém que desrespeita o direito alheio, além das próprias situações de auto bullying em que alguém exagera na superexposição nas redes sociais, com algo que lhe constrangerá no futuro.

Exemplo de abuso de violação do direito de imagem seria na situação em que alguém usa a imagem de outra pessoa sem autorização ou em uma montagem ou em uma situação de exposição íntima, assim ofendendo a imagem retrato de outra pessoa, ou seja, aquilo que ela aparenta; ou ainda a imagem atributo que são as condições pessoais da pessoa, como ela se apresenta publicamente, a sua profissão, a sua honra, a sua reputação e etc., com o uso de uma deepfake (alteração da imagem ou voz da vítima, explicando de modo singelo).

Em outra frente também observamos desrespeito flagrante a dignidade da pessoa humana daqueles indivíduos que realizam ofensas gratuitas ou crimes de ódio, sendo que nestes é atacada a opção sexual, a escolha religiosa ou há uma ofensa sobre a questão de raça ou cor da pessoa escolhida como vitima, valendo frisar que nessas últimas o ordenamento jurídico contemplará com penas mais severas o agressor pela própria gravidade do delito.

Tais incidentes podem ocorrer, a título ilustrativo, em ambientes digitais, dentro de um grupo em que há um aluno ou algum funcionário, alguém convidado que participa daquele agrupamento, deste modo extrapola no seu direito de manifestação com constrangimentos ou violação de direitos, porém temos visto vários incidentes em que reuniões, palestras, aulas ou encontros de natureza pública são invadidos por pelos chamados crackers, ou seja, “os hackers do mal”, sendo emblemático para citação o caso recente em que uma live de uma respeitável Promotora Pública de São Paulo defensora dos direitos femininos foi invadida, tendo o(s) cyber criminoso(s) inserido na plataforma de apresentação vídeos pornográficos e ofensivos às mulheres.

Vale frisar que todos nós estamos suscetíveis a participar de algum incidente como vítimas sejamos pessoas físicas ou jurídicas, pessoas anônimas ou pessoas públicas. Vale trazer à baila alguns exemplos recentes: do Procurador que soltou pum na audiência; do Vereador que cheirou a calcinha numa live; e da situação de sexo explícito que ocorreu dentro de uma audiência pública relativa à merenda (estavam lanchando?). Também se observou uma audiência pública em que estava o Ministro da Economia (acusou a presença do peladão) e o Presidente da República, momento em que um participante apareceu nu, assim como muitas outras situações, a citar: um advogado assistindo uma audiência numa rede, uma advogada que fez uma sustentação oral dirigindo e foi reprimida pela Desembargadora e tantas outras.

Bem como se observou, com pessoas não públicas, outras situações mais próximas e comuns em que um pai de aluno enviou os trabalhos para a Professora e no meio do trabalho tinha os chamados nudes (propositalmente?!), além de diversos incidentes relatados em que as pessoas esquecem os microfones abertos e os pais de alunos falam mal dos outros alunos ou dos outros pais ou dos professores, o que deixa os ambientes digitais por vezes no chamado “climão”, com prejuízos as vezes irreparáveis. Para as instituições, pergunta-se, principalmente as de ensino: treinaram ou ensinaram os professores, pais e alunos, as devidas posturas no mundo digital?

De fato o que é imperioso, nesse momento, é um investimento maciço em Educação Digital, para que se tenha consciência crítica do uso da tecnologia, bem como das suas responsabilidades, que apesar das plataformas serem por alguns denominadas de “virtuais” o que é dito nesses ambientes traz consequências no mundo físico, real, com eventuais danos patrimoniais a imagem, a segurança, ao funcionamento de instituições, a saúde mental das pessoas, riscos de morte (fake news, extorsões e exposição de localização de pessoas visadas); para o direito importa as consequências, com responsabilidades assumidas tanto no campo cível quanto no campo criminal, de maneira que a legislação já existente é apta para resolver as situações mais extremas.

Nosso sistema jurídico, a título exemplificativo, composto pela Constituição Federal, o Marco Civil da Internet, a Lei Geral de Proteção de Dados, o Código Civil, o Código Penal, o Código Eleitoral, a chamada Lei Carolina Dieckmann, o Código de Defesa do Consumidor a Lei de Combate ao Bullying e outras legislações aplicáveis são aptos para resolver os principais incidentes observados, desse modo não falta legislação; por exemplo, um juiz terá que conhecer a legislação e julgar conforme os fatos, sempre achando uma saída sistêmica, mas, pelo visto, não há ausência de normas, exceto em casos novos e muito específicos, como as fake news que vem sendo resolvidas pela legislação vigente, mas com diversos projetos de lei para especificar a temática.

O que seria ideal que tudo fosse sanado de modo preventivo antes dos fatos delituosos ocorrerem (mas todos conhecem as leis?) ou com a Mediação quando possível, porém as situações mais graves tem que ser denunciadas às autoridades competentes. Se o incidente se materializar no âmbito escolar cumpre observar os Regimentos Internos e as normas autoaplicáveis num primeiro momento, não sendo possível sanar as situações por essas vias clama que se procurem os órgãos competentes para apurações, por exemplo, o Conselho Tutelar, a Delegacia de Polícia do Bairro, a Promotoria Pública ou a Vara da Infância e da Juventude quando envolvidos crianças e adolescentes. Nas situações em que participem adultos que se busque a Polícia ou diretamente o Pode Judiciário.

O melhor dos mundos é conscientizar e criar normas de boa convivência, para prevenir incidentes e desgastes inúteis, propondo-se para se desligar os microfones quando necessário, limitar o acesso às salas com cadastro prévio, assim como ter o responsável pela reunião meios de expurgar o participante indigesto com urgência. Contudo não há uma fórmula pronta, dada a grande quantidade de variáveis, ademais considerando que estamos trocando os pneus com o veículo em movimento.

Por questões educativas, tudo isso deveria ou deve ser observado com urgência pelas Instituições, ainda mais pelas do ramo do ensino, públicas ou privadas. Além da missão cultural e de participar do ciclo de aprendizagem e ensinança, tal encargo deflui da própria Lei de Diretrizes e Bases, do Estatuto da Criança e do Adolescente, da Lei de Combate ao Bullying, do Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados, para exemplificar, este último impingindo sanções pela violação de dados que podem chegar a 2% (dois por cento do faturamento) a 50 (cinquenta) milhões de reais). Mais um fato novo para deixar todos os relacionamentos digitais mais complexos. Quem quer pagar para ver, desrespeitando direitos ou sendo permissivo com isso?

Fonte: Administradores.com – Por: Adriano Fidalgo – 25/09/2020 – 18:13h